sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

O que esperar deles?

Olá...

Hoje quero falar um pouco sobre expectativas...

No que diz respeito a cumplicidade, o que esperar de um dependente químico na relação?
Será que podemos esperar algo deles?
A minha resposta é: DEPENDE!
Tenho DUAS linhas de raciocínio quanto a esse questionamento.

1ª Linha: DQ em recuperação

Um adicto está em recuperação quando ele aceita suas limitações e entende que precisa encontrar e aprender uma nova maneira de viver.
Esse homem (ou mulher) será como outro qualquer: com inúmeras qualidades e defeitos.
Ele será seu melhor amigo, seu companheiro, um marido fiel. Poderá ser um pai maravilhoso, caso optem por filhos. 
Você poderá fazer planos de viagens, ir ao cinema, andar de mãos dadas, conversar, sorrir.
Poderá também chorar junto na hora que o coração aperta.
Esse homem pode te ajudar nas tarefas de casa, te fazer surpresas, trazer presentes. Sonhar com a casa própria.
Esse homem vai te abraçar e cuidar de você com todo amor que você merece.
Esse homem reconhecerá o seu valor!


Com ele você pode ter momentos de altos e baixos, não por causa das drogas, mas porque em 100% dos relacionamentos esses altos e baixos existem!
Afinal, nem mesmo no mundo maravilhoso de Alice a perfei
ção existe!

Ouso a dizer, que esse homem poderá ser ainda mais completo que um "homem normal", como a sociedade gosta de dizer, porque ele compreende a importância de viver em serenidade e em busca de seu bem estar. Ele valoriza cada conquista e quando faz algo "errado", o Programa "grita" em sua mente e ele liga a luz de alerta.
Esse homem te vê como um anjo na vida dele!

Falo isso com propriedade, pois conheci vários adictos, com anos e anos de recuperação, e que são maridos maravilhosos. E eu nunca acreditaria que, num passado qualquer, já fizeram atrocidades para sustentar o vício se eu não tivesse escutado seus testemunhos!


2ª LinhaDQ fora da recuperação

A doença da DQ leva ao desvio de caráter.
É importante destacar que essa característica, na verdade, independe da droga, mas no DQ ela é um pouco mais latente. Conheço pessoas com um tremendo desvio de caráter, mas que não usam drogas!

Quando ele ainda não se aceitou, as coisas complicam um pouco mais...
Certamente você não poderá contar com ele para muitas coisas, aliás, para quase nada!
Triste realidade...

Ele não conseguirá te ajudar no mínimo que você precisa.
Já ouvi relatos de cortar o coração: grávidas, mamães etc.

Não ache que ele vai te ajudar a trocar as fraldas do bebê...
E não adianta implorar ou fazer chantagens. Ele não vai se comover!
Às vezes você está com problemas pessoais e só quer conversar ou precisa de um abraço apertado e de escutar a frase: "Calma, tudo vai dar certo!"
Às vezes você só quer desabafar...
Mas o adicto não vai conseguir te ajudar nessa...
O egocentrismo o domina!
Por mais que você sempre esteja disposta a ajudá-lo quando ele pede, na hora em que você pedir ajuda, não vai conseguir!
Ele não se importa com as contas da casa, com as crianças crescendo sem pai, com suas angústias, com nada...
Você não terá nada dele. Não quer dizer que ele não te ama, mas infelizmente ele tem "outras prioridades". É mais forte que ele.

Você pode estar com a cabeça a mil por hora, cheia de confusões mentais, problemas financeiros, de saúde, de medo de tudo. Não tente dividir suas angústias ou conversar sobre o trabalho com ele, porque você vai se frustrar!

Às vezes você daria tudo por um simples abraço apertado para amenizar seus problemas, mas ele não é capaz nem disso!

O mundo gira ao redor dele, apenas dele.


O que fazer, então?
Bom, o caminho que indico é que vá para o grupo e aprenda a praticar o exercício do desligamento. Aquiete seu coração no grupo...
Não crie expectativas em ABSOLUTAMENTE nada pois elas nos levam a frustração e a dor...
Olhe para si mesma e aceite as 24 horas que Deus te presenteou!



PS1: eu tive momentos com os dois personagens em minha ralação...

PS2: estar limpo é diferente de estar em recuperação (meu DQ já passou pelas duas situações).

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Não resisti, vim dar um "Oizinho"...

Oiê...

Não resisti, precisei vir aqui para dizer que estou bem.
Final de ano tranquilo, assim como o início do novo ano.
Em paz e conseguindo manter a serenidade ao longo das 24 horas que recebo para desfrutar a vida.

Ainda não é hora de voltar a escrever de maneira rotineira.
Ainda não é hora de muitas coisas. E repito isso para mim mesma todos os dias.

Entretanto, eu resolvi dar uma passadinha aqui para explicitar no que (ou em quem) me transformei após a dependência química ter feito parte de minha vida...

O desabrochar de uma Flor...


Da infância a adolescência...
Sempre fui sonhadora e vivia num mundo paralelo acreditando que os sonhos deveriam ser como nos contos de fadas  e não me conformava quando descobria que as coisas "não eram bem assim".
Um ciclo contínuo de autopiedade e uma sensação de vazio associada a sentimentos depressivos e de solidão me acompanharam desde a infância...
Eu era insatisfeita comigo mesma, com minha aparência, com meu corpo...
Eu não me aceitava e cresci me jugando como a pior das criaturas, aquela que sempre faz tudo errado. Sofria demais por tudo.

Da adolescência a juventude...
Entrei na faculdade muito nova, aos 17 anos, e fui morar em outro estado, a 650 Km de casa. Na época, nem eu acreditei que tive essa coragem. Eu não fazia nada sozinha, sempre fui dependente de alguém.
Só comecei a entender que eu tinha algumas capacidades por volta dos 20 e poucos anos, mas ainda assim, o medo era meu maior companheiro.
Auto-estima era uma palavra que não existia no meu vocabulário. Tive alguns "lances afetivos" nessa época, mas nada sério. Nenhum relacionamento concreto.
A auto-piedade era muito viva em mim. Latente...
Entretanto, eu já sabia que eu existia!
Concluí a faculdade e retornei para casa.

Da juventude a vida adulta...
Os sentimentos de vazio ainda faziam parte de mim. Culpas, medos, autopiedade, solidão, auto-estima  ZERO...
Lembro que só tive coragem de sair de casa usando um short (para algum lugar que não fosse praia) aos 26, 28 anos, por aí...
Conheci o DQ de minha vida em 1999, num carnaval, com 23 anos.
De 1999 até 2005 tivemos encontros e desencontros que aconteciam esporadicamente e sem compromissos.
Mas sempre era bom, deliciosamente divertido, mesmo sem termos nada sério, concreto...
Ele sempre soube me fazer sorrir.

Em paralelo, tive meu primeiro relacionamento sério com um outro cara. Eu era professora e ele office-boy. Foi uma história meio "Eduardo e Mônica", mas sem o final feliz narrado por Renato Russo. Uma relação doentia e dada ao fracasso desde o início.
Eu dependia emocionalmente dele e cai num fundo de poço com o término. O sentimento de autopiedade ficou ainda mais intenso...
Comecei a fazer terapia em 2007 e levei alguns anos para me reerguer.
Hoje olho para trás e vejo como, desde aquela época, eu já era completamente codependente.


RESUMINDO: levei cerca de 35 anos para começar a entender que eu era alguém.


A vida adulta - PARTE I
ANTES e DURANTE a DQ...
Com a terapia eu entendi que eu existo, que tenho valores, qualidades etc...
Mas ainda permaneci muito tempo cheia de conflitos e a auto-estima meio complicada. 
O DQ reapareceu na minha vida em 2011. Mas dessa vez iniciamos um relacionamento e hoje sei que aquele encontro de 1999 foi amor a primeira vista...
Eu acabara de sair do fundo de poço do relacionamento anterior.
Lembro das palavras de minha psicóloga: "Fique atenta, os DQs são extremamente sedutores!".
Acho que não compreendi muito bem o que ela queria dizer e encarnei o espírito de salvadora da pátria que tinha a missão de cuidar dele e protegê-lo. Tornei a me afundar! Claro!
E o poço foi muito, muito, muito fundo dessa vez...
E o resultado foi a internação dele, em 2012, de maneira traumática e dolorosa.
Ele havia perdido tudo, só lhe restava a vida.

A vida adulta - PARTE II
Dentro do poço havia uma mola...
Não sei explicar muito bem de onde veio a força que me impulsionou, acho que foi da fé.
Percebi que não adiantaria ficar lamuriando e deixando a dor me corroer. E então, descobri que havia uma mola dentro do poço, e essa mola me ajudou a sair de lá.
Algo dentro de mim gritava por respostas, eu queria compreender o por que daquilo tudo e, por isso, quando ele estava internado estudei muito sobre sua doença. Eu consigo perceber, com riqueza de detalhes, a metamorfose que passei.
O fato de ser professora de química, abordar o assunto nas aulas e trabalhar num ambiente onde a droga faz parte do contexto me ajudou bastante.
Três meses após sua internação nós reatamos.

Foi a primeira vez na minha vida que eu fiz algo que EU queria fazer, que tomei uma decisão com base nos MEUS sentimentos. E eu estava disposta a encarar o mundo para assumir a MINHA decisão de ficar com ele, independente do nariz torcido de alguém.

Eu era outra pessoa.

- Aprendi que não tenho que dar satisfação da minha vida para ninguém (salvo minha mãe).
- Não preciso que as pessoas aprovem minhas escolhas. Sou responsável por elas e por suas consequências.
- Aprendi que sou a única responsável por minha felicidade e por minhas tristezas.
- NINGUÉM, além do meu Poder Superior, sabe dos anseios do meu coração. As pessoas sabem apenas o que eu permito que elas saibam.
- Aprendi que em boca fechada não entra mosquito.
- Aceitei por inteiro meus defeitos e descobri minhas qualidades, meu valor e meu potencial.
- Descobri a felicidade pertinho de mim.
- Enxerguei que usava a máscara da auto-piedade e resolvi tirá-la.
- Descobri que minha auto-estima estava quase anulada e precisava mudar isso.

A vida adulta - PARTE III
Hoje completam-se exatos seis meses que o meu grande amor se foi.
E eu estou viva.
E outro dia, pensando na vida, comparei o rompimento com adicto com o rompimento com aquele outro cara, que mencionei na fase da "juventude a vida adulta".
Fiquei muito feliz com o resultado ao perceber o quanto evoluí...

Aceitação é a palavra que descreve o rompimento.
Chorei desesperadamente durante QUATRO dias. Depois olhei para mim mesma e disse:
"Eu tenho um Programa de Recuperação e um Deus amoroso que quer o meu melhor e que sabe de todas as coisas".

Aceitei a realidade que Deus havia preparado para mim, e a cada dia eu digo a mim mesma:
"Só por hoje o que eu tenho é a ausência dele aqui. Posso aceitar isso ou sofrer. Escolho aceitar!".

Aceitação, maturidade, sabedoria e uma busca contínua pela serenidade. É assim que eu vivo durante as 24 horas que recebo do meu Poder Superior.
A certeza de que tenho muitas qualidades e o reconhecimento de meus defeitos e meus desvios de caráter fazem com que a minha auto-estima cresça.

Ainda tenho um longo caminho, principalmente no que diz respeito a ansiedade, meu imediatismo. Eles fazem com que eu me sabote sempre.
Meu foco agora é trabalhar para controlar isso.
Acho que existe um ar de adicta em mim, pois tenho dificuldades em relaxar (risos).
Ainda tenho medos e receios. Ainda erro muito, mas aprendi a me perdoar diariamente e isso tem me trazido uma enorme leveza e paz no coração.

Mas, ao menos, hoje eu sou capaz de identificar os momentos de aflição exagerada, o que me leva a tentar respirar fundo, contar até 10 e esperar... Esperar o tempo certo...

RESUMINDOCom a ajuda de um Programa, levei cerca QUATRO anos para sofrer uma  metamorfose. Foi tudo muito rápido e mágico!


Concluindo: Precisei passar por um tsunami para me descobrir e me transformar numa pessoa infinitamente melhor do que eu era.
A DQ é muito triste e avassaladora, mas eu lutei para tirar o melhor dela.
Sim, eu aprendi que em tudo que passamos na vida podemos tirar algo de bom, basta mudar o olhar e enxergar as graças divinas.
Gratidão por eu ter me transformado em quem eu sou hoje!


Reflexão para hoje: 
Que eu me lembre sempre que a autopiedade destrói, enquanto a auto-estima me faz crescer. Crescendo sou capaz de me transformar em um ser humano desprendido e rico em emoções, podendo espalhar paz e serenidade onde vivo.
(Trinta e um dias no Nar-Anon - dia 5)

Paz, luz e 24 horas de serenidade a cada um de vocês!